sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

CAMINHAR NA NATUREZA


«Caminhar na natureza
É como estar numa enorme biblioteca
onde cada livro contém apenas frases essenciais.»

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O PRIMEIRO BEIJO


Para a minha doce amada...

O céu ficou silencioso e de olhos baixos,
Os pássaros calaram todos os seus cantos;
O vendo emudeceu; a música das águas acabou
De repente; o murmúrio da floresta
Morreu lentamente no coração da floresta.
Na margem deserta do rio tranquilo,
Nas sombras do anoitecer desceu silenciosamente
O horizonte sobre a terra muda.
Nesse momento no silencioso e solitário alpendre
Beijámo-nos pela primeira vez.
Nesse momento exacto, ao longe e perto
Repicaram os sinos e soaram os búzios
Nos templos dos deuses apelando ao culto.
Um estremecimento percorreu o infinito mundo das estrelas
E os nossos olhares encheram-se de lágrimas.

Rabindranath Tagore

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

PERGUNTA

Deus, mais uma vez ao longo dos tempos enviaste mensageiros
Para este impedioso mundo:
Eles disseram, «Perdoa a todos», e disseram, «Ama o próximo -
Liberta o seu coração do mal.»
Eles são venerados e lembrados, embora nestes obscuros dias
Os mandemos embora com insensíveis cumprimentos, para fora das
nossas casas.
E entretanto vejo dissimulados ódios assassinando os desamparados
sob a capa da noite;
E a Justiça a chorar silenciosamente, furtivamente, o abuso do poder,
Sem esperança de redenção.
Vejo jovens a trabalhar freneticamente,
Aflitos, batendo com a cabeça na pedra, inutilmente.

Hoje, a minha voz calou-se; não tenho música na minha flauta:
A negra noite sem lua
Encarcerou o meu mundo, mergulhando-o num pesadelo.
E é por isso que, com lágrimas nos olhos, pergunto:
A esses que enveneraram o teu ar, a esses que apagaram a tua luz,
Será que lhes perdoaste? Será que os amas?

Rabindranath Tagore

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

QUEM AMA

«Quem ama, fica mais simples, e sabe que as coisas são passageiras.
Quem ama sabe esperar e ser verdadeiro com os acontecimentos da alma e do corpo.
Amar é não ficar agarrado às coisas que passam,
é tomá-las como certeza de caminho percorrido e coragem de continuar.»


António Valério, s.j. (Visite: http://amar-tesomente.blogspot.com/)

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

APETECIA-ME POR VEZES...


«Apetecia-me por vezes entrar numa casa ao acaso, sentar-me na cozinha e perguntar aos habitantes de que têm medo, o que esperam e se compreendem alguma coisa da nossa presença comum sobre a terra. Fui suficientemente adestrado para reter esse impulso que, no entanto, me parece o mais natural do mundo.»
Christian Bobin, em "Ressuscitar"

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A TÍLIA


«A tília em frente da janela é o mestre que escolhi para escrever e sei de antemão que não poderei igualá-lo: nem mesmo os maiores escritores alguma vez escreveram com tanta graça como esta árvore inscreve delicadamente a luz e a sombra em cada uma das suas folhas e renova a sua inspiração a cada segundo.»
Christian Bobin, em "Ressuscitar"

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

SOLIDÃO DERROTADA

«Julgo que o mais importante são as palavras. Quando se vive a solidão, sabe-se que, por causa duma palavra verdadeira, caem muitas vezes as muralhas que levantámos à volta das nossas almas. Uma palavra verdadeira pode ser um milagre: é a solidão derrotada.»

António Alçada Baptista, em "Tia Suzana, meu amor"

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

O LUGAR ONDE VIVEMOS

«Vivemos em cidades, em ofícios, em famílias.
Mas o lugar onde vivemos em verdade não é um lugar.
O lugar onde vivemos verdadeiramente não é aquele onde passamos os nossos dias,
mas aquele onde esperamos - sem conhecer o que esperamos -,
aquele onde cantamos - sem compreender o que nos faz cantar.»

Christian Bobin

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A DOÇURA DE VIVER

«Quanto à doçura de viver, é imutável através dos séculos.
Ela é feita da calma de uma conversa,
do repouso de um corpo, de uma cor de um mês de Agosto.
É feita do pressentimento de que se viverá sempre,
no próprio instante em que se vive.
O amor de si é o primeiro estremecimento do Deus no rejúbilo de um coração.
A doçura de viver é a guarda avançada de uma vida eterna na vida de hoje.»

Christian Bobin

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

ALEGRIA


«Uma coisa sabemos: se a nossa alegria se funda no exterior, virá e partirá segundo os acontecimentos e as marés. Quando o exterior nos rasgar o vestido da alegria, lancemos os olhos para dentro, para o mais secreto paraíso que nos habita.» Henrique Manuel

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

AS MÃES


«Há a que vela pelo que ela ama - sem o impedir de seguir o seu caminho. E há a que se atormenta pelo que ela ama - tratando de lhe modificar o andamento. Há Marta e há Maria, as duas irmãs encontradas por Cristo ao passar. Marta preocupada com a ordem e a comida, rodopiando na sua cozinha, perdida num rumor de pratos e de água a ferver. E Maria, com o avental enrolado debaixo de um banco, Maria sentada no chão, as pernas metidas para dentro como as asas de um pássaro no instante do repouso, o rosto aberto, as mãos vazias, Maria preocupada com esse amor sem o qual toda a ordem é triste, toda a comida sensabor. Marta e Maria. A dispersada, a recolhida. A incessante e a apaziguada.
As mães são ambas, não raro ao mesmo tempo. A sua preocupação com o filho tanto as cega como as ilumina. Elas contemplam a carne da sua carne. Vêem o filho viver, mas nunca crescer. Vêem o filho na eternidade da sua idade, nunca vêem a passagem de uma idade a outra, de uma eternidade à seguinte. Um belo dia, elas voltam-se, miram cheias de espanto este mocetão que acaba de entrar em casa, este homem enleado na sua própria força - já não sabendo como pôde provir delas tanta força e falta de jeito, não compreendendo nada de nada: pois se o filho cresceu, o coração delas não envelheceu, ardendo como nas primeiras dores do parto...»
Christian Bobin, em "Um Deus á Flor da Terra"

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O AMOR E A VERDADE


«N. é decoradora de interiores numa cidade onde, para viver da sua arte, encontra bastantes pessoas ricas e tolas a ponto de não decidirem sozinhas o seu próprio gosto.
Decoradora é ela até à raiz dos cabelos. Cada um dos seus gestos é elegante, fala com linguagem cuidada, sem ostentação, da mesma forma que em sua casa cada "bibelot" está, milimetricamente, no exacto sítio onde deve estar para contribuir para a discreta harmonia do conjunto.
O seu coração, tal como a sua casa, estão arranjados de acordo com uma arte refinada e mesmo a desordem tem lugar previsto. Numa tal vida, a verdade e o amor, supondo que aí pudessem ter lugar, surgiriam como faltas de gosto imperdoáveis.»
Christian Bobin, em "Ressuscitar"